18.9.06

mais um sonho

Eu estava deitada no seu colo, era confortável, seguro. Você era velhinho, bem velhinho e tinha toda a sabedoria que a idade pode trazer - tinha vivido o melhor da vida. Vestia uma bermuda verde, uma camisa rosa e um chapéu roxo bem bonitinho. Continuava magrinho, mas a idade lhe havia proporcionado uma barba rala e branca e a necessidade de usar óculos. Você me fazia carinho e eu não estranhava o fato de termos nos conhecido com a mesma idade e que você envelhecera e eu não. Eu sabia que além das rugas o tempo também lhe aguçara a malandragem, e que eu ali, assim entregue, estava mais uma vez dando a cara a tapa, vulnerável. Tudo isto era claro, porque estávamos em um sofá no meio de um pantano. À nossa volta: a vida, seus perigos e prazeres. Em torno do sofá na confusão do pantano, peixes se disfarçavam de folhas. Eram baiacús, extremamente lindos, venenosos e espinhentos, mas pra você não representavam risco algum; eram apenas folhas secas, sujeitos ao seu controle. Eu tinha medo de sair de lá pra vida, e também de estar lá, de você, mas o teu carinho me inebriava, e eu não pensava em mais nada.
Não sei como, um espinho de um baiacú me pegou na palma da mão, e foi o maior medo que eu já senti. O risco confirmado, a certeza do fim. Delicadamente, você tirou o espinho, que saiu ensanguentado e doeu. Então me levantei, fui em direção ao resto. A cada passo um peixe virava folha seca; eu sabia que era disfarce, mas nem ligava; não tinha mais nada a perder.

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