13.10.10

Os jogos da memória

Em Halbwachs, as noções de tempo e espaço são estruturantes dos quadros sociais da memória, ambos instâncias solidárias entre si, fundamentais para a rememoração do passado na medida em que as localizações espaciais e temporais das lembranças são a essência da memória. Nada escapa, nem mesmo a memória, a esta trama de consolidação das estruturas espaço-temporais que configuram a existência social, uma vez que é da combinação dos seus diversos elementos, através da linguagem, que pode emergir a lembrança das memórias individuais.

Halbwachs reconhece, de muitos modos, a vibração do tempo no conteúdo material das lembranças, atribuindo à memória o princípio “intencional” e “imaterial” de uma coordenação entre as diferentes temporalidades e as regiões do espaço em que se produzem, visto serem as lembranças solidárias das regiões da experiência social, as quais, por sua vez, lhe são irredutíveis. (...) O Tempo revela-se cada vez mais como duração, preenchido por falhas e lacunas, fenômeno que reflete o arranjo da matéria pela vida, o que lhe permite referir que a memória, na linha do que afirmará Bachelard posteriormente, é tributária da sinergia de múltiplas causalidades, tanto formal quanto material, e onde o fluxo temporal contínuo da consciência, proposto pelo bergsonismo, se esvanece.

Neste sentido, a memória não se configura apenas num tradicionalismo de cunho nostálgico e sentimental, mas nos mitos, saberes, fazeres e tradições que são perenizados, ordinariamente, no interior das manifestações culturais humanas, a contragosto das intimações objetivas de um devir, “numa seqüência de fixações no espaço da estabilidade do ser”.

(Ana Rocha e Cornélia Eckert. Os jogos da memória. Revista Ilha, n.1. Florianópolis, dezembro de 2000, p. 71-84)

2.10.10

Depois de muito tempo de seca, choveu saudade.

9.9.10

sonho

sonhei que você tinha um bichinho andando na sua cabeça
era tipo uma planária pequenininha
ela tava andando na sua testa
e ia entrar no seu cérebro
daí eu tirei ela com a mão e joguei no cinzeiro

23.7.10

Fortuna

garimpando tristezas do passado
tentava fugir da felicidade
injusta sina

Visita poética de papai

SQN - Super Quadra Norte - Bloco X - 303.
Eu, estes sábados felizes e vocês.
Su casa, mi casa, nossa rua , vila, cidade, pais, continentes, planeta.
Um universo de amigos, luas, astros, estrelas, outros corpos celestes, cometas.
Contidos em seu risos, seu cabelos, palavras serenas, tom de voz e olhar.
Esta passargada, vocês, mi casa, o abrigo, vocês, a ilha, su oásis, su lar.
Tão confortável quanto seus abraços, beijos e todos os meus desejos de viver em paz.
Os dois caramujos no caminho, carregando uma só casca
Os dois passarinhos no ninho, protegidos da tempestade
Dois desejos realizados em uma só vontade
Dois corpos humanos habitando uma só alma
Vocês, eu e mi casa.
...e pra quem, como eu, tem olhos de sentir alem de ver
Ela é a mais bonita de Brasilia, do Brasil e do mundo.
Igual a vocês, igual a vocês. Igual a vocês.


(este deveria ser o blog do meu pai.. hehe, só ele posta aqui=P)

2.6.10

É, eu sinto saudade sim.

Relendo seus textos e poesias, revivo a cidade. A poluição visual. Sonora. Tátil. A Vila Madalena. O metrô. A rua Augusta. Sinto falta de todas as alegrias vividas ali e também das tristezas. Sinto saudade de uma época. Quando penso na cidade revivo o apartamento. Nossos silêncios. Minhas tagarelices. As primeiras festas na cozinha de casa. Os jantares. Os filmes. Relembro dos livros que emprestaram assunto às nossas noites. De não ter com quem falar. Dos fins de semana. De me envergonhar das poesias. Me orgulhar delas. Te admirar. Te recriminar. Me orgulhar de você. Te procurar. Ser encontrada. Te amar. Ser amada. Não importa a distância. Mas este silêncio - puta que pariu!

5.4.10

Difícil ser funcionário

João Cabral de Melo Neto

Difícil ser funcionário
Nesta segunda-feira.
Eu te telefono, Carlos
Pedindo conselho.

Não é lá fora o dia
Que me deixa assim,
Cinemas, avenidas,
E outros não-fazeres.

É a dor das coisas,
O luto desta mesa;
É o regimento proibindo
Assovios, versos, flores.

Eu nunca suspeitara
Tanta roupa preta;
Tão pouco essas palavras —
Funcionárias, sem amor.

Carlos, há uma máquina
Que nunca escreve cartas;
Há uma garrafa de tinta
Que nunca bebeu álcool.

E os arquivos, Carlos,
As caixas de papéis:
Túmulos para todos
Os tamanhos de meu corpo.

Não me sinto correto
De gravata de cor,
E na cabeça uma moça
Em forma de lembrança

Não encontro a palavra
Que diga a esses móveis.
Se os pudesse encarar...
Fazer seu nojo meu...

Carlos, dessa náusea
Como colher a flor?
Eu te telefono, Carlos,
Pedindo conselho.

3.4.10

só é possível perceber no outro aquilo que existe para você

lista de coisas boas

fazer planos para decorar a casa
dormir e acordar abraçadinha
levantar no meio da noite, ele perceber e me chamar de volta
ser bem recebida na nova cidade
ser bem recebida na família dele
ser bem recebida pelos amigos dele
receber visita dos queridos na cidade nova (mãe, pai, amo vocês)
saber que eu tinha um leitor que não me achava brega! (Adriano, fiquei muito feliz!)
conhecer restaurantes e sabores diferentes
atravessar a cidade de madrugada para ver quem se quer bem
ter que reaprender a dirigir
acordar com as crianças na casa
almoços na casa da sogra
ter a sogra mais querida do mundo (e o sogro também)
jogos, jogos e mais jogos
o apartamento ter saído tão rápido
sair para comprar coisas para a casa (apesar dos gastos, saber que logo vou poder pagá-los)
as pessoas do trabalho serem massa
o trabalho ser massa
ter incorporado o "massa!" no meu vocabulário
rever velhos amigos
ser útil
se saber útil
se saber competente
irmos juntos para o trabalho
sairmos juntos para almoçar
voltarmos juntos para casa
ser atendida pelo Fernando, no amigão
comidinhas e bebidinhas nas casas dos outros
ver meu bem discotecar
ter o melhor dj do mundo na minha festa, na casa da Marília
ter o pior dia do mundo encontrar os amigos na festa (e ainda tolerantes com o meu mau humor)
o pão de mel lá da SID
a Adriana dançando jongo, cavalo marinho
as cores da Thaís
cozinhar quando dá vontade
ouvir novas músicas
jogar rock band (mas melhor que jogar, é ver o Thi se divertindo a valer na bateria!)
ganhar do Pandemic!!!!
sair de São Paulo à lá trapalhões!
descobrir que fui eu mesma até nesta hora (esqueci a porta de casa aberta)
receber votos de felicidade
até é bom sentir saudade, perceber que (pelo menos) o carinho está sempre presente
telefone! (nunca gostei tanto)
receber ligações de amigas de São Paulo
o céu!
as chuvas (principalmente quando acaba a luz no ministério!)

29.3.10

Sabores da infância

Rosca da tia bisavó (esqueci o nome dela, de Fernandópolis)
Pamonha de Fernandópolis
Bolinho de chuva na casa da tia lídia
Mantecau feito com a vovó
Rosquinha de coco feita com a vovó
Fondue de queijo
Fondue de chocolate
Fígado da mamãe
Pizza de berinjela da mamãe
Bolo de arroz da mamãe
Sanduíche de forno da mamãe
Ovos com ervilhas da mamãe
Danete que a Sônia fazia
Bolos de chocolate
Doce de laranja da Márcia (Súgule?)
Torta de brigadeiro do Madre Paula
Bala Chiclete
Risoles de catupiry da esquina da Alzira
Canolis da esquina da Alzira
Bolacha de cajuzinho

24.3.10

Capital social e desenvolvimento

Autor: Juarez de Paula

Fonte: Desenvolvimento & gestão compartilhada

Quanto maior a capacidade de as pessoas se associarem em torno de interesses comuns, melhores as condições de desenvolvimento

O desenvolvimento requer o crescimento dos níveis de confiança, cooperação, ajuda mútua e organização social, o que tem sido denominado como “capital social”. Quanto maior a capacidade das pessoas de se associarem em torno de interesses comuns, ou seja, quanto maiores os indicadores de organização social, melhores as condições de desenvolvimento.

Como o capital físico (terra, edifícios, máquinas) e o humano (aptidões e conhecimentos), o capital social produz riqueza e portanto tem valor para uma economia nacional.

Segundo o pesquisador social Francis Fukuyama , o capital social pode ser definido como um conjunto de valores ou normas informais, comuns aos membros de um grupo, que permitem a cooperação entre eles.

O capital social tem benefícios que vão muito além da esfera econômica. Ele é essencial para a criação de uma sociedade civil saudável – grupos e associações que estão entre a família e o Estado.

O capital social é formado pelas relações sociais. Quanto mais complexas elas são, maiores as relações de confiança. Como a confiança está na base das relações de troca que suportam o mercado, sem capital social não há possibilidade de crescimento econômico.

Robert Putnam afirma que o capital social diz respeito a características de organização social, como confiança, normas e sistemas que contribuam para aumentar a eficiência da sociedade.

Quanto mais elevado o nível de confiança numa comunidade, maior a possibilidade de haver cooperação. E a própria cooperação gera confiança. Baixos índices de capital social também refletem em menores condições de competitividade, pois a competitividade exige algum nível de cooperação.

22.2.10

Agora só espero a despalavra: a palavra nascida
Para o canto – desde os pássaros.
A palavra sem pronúncia, ágrafa.
Quero o som que ainda não deu liga.
Quero o som gotejante das violas de cocho
A palavra que tenha um aroma ainda cego.
Até antes do murmúrio.
Que fosse nem um risco de voz.
Que só mostrasse a cintilância dos escuros.
A palavra incapaz de ocupar o lugar de uma imagem.
O antesmente verbal: a despalavra mesmo.

manoel de barros, Retrato do Artista Quando Coisa